Quando todas as coisas finalmente pararem de fazer sentido o que restará no abismo além do frio e de um espelho? Prefiro o frio, disse o menino. Eu entendo o menino.
Se todas as coisas caminham inexoravelmente para a solidão porque não ser solitário desde já? Prefiro televisão, disse o menino. Eu entendo o menino.
Existe algo menos real do que um amor de fachada? Existe, disse o menino. Um fantasma. Eu entendo o menino.
Alguém ainda conseguirá nos abraçar com mais do que braços e nos entender com mais do que boa vontade? Acho que não, disse o menino. Concordo com o menino.
Sendo tudo assim, por que ainda falamos? Eu não falo, eu só respondo, disse o menino.
Estás com sono? Não, ele disse. Eu também não, comentei. Vamos falar sobre o quê? (pergunta minha). Podes escolher (resposta dele).
Resolvemos falar sobre nada, como alguém que faz sexo de madrugada porque é melhor do que ficar de olhos abertos para a escuridão.
Qual a tua cor preferida? Verde.
Qual o teu time? Flamengo.
Qual o teu ator preferido? Al Pacino.
Onde gostarias de fazer amor? Numa ilha deserta.
Perfume preferido? (o menino não sabia nomes de perfumes).
Sonho de consumo? Um avião.
Comida? Churrasco.
E assim fomos até gozarmos. Viramos de lado e fingimos dormir. Como a vida é simples quando se olha pra ela como se olhássemos admirados para uma vedete dos tempos do rádio...
Beijos (ou apertos de mão distanciados)