sexta-feira, 2 de maio de 2008

a cabeça empalhada do animal na parede manchada da sala

Um poema de Eráclito Borges (assinado com minhas lágrimas) e um texto meu.
Desculpem-me, amigos, pelo que fui e pelo que fiz, pelo que sou, por não seguir aquilo em que acredito.
Desculpem-me por colocar pedras no caminho, por tirá-las quando nos protegeriam,
por lançá-las uma a uma, em chuvas torrenciais, sobre as cabeças de quem amo.
Desculpem o mal que faço, o bem que nego, os passos tortos e todo o resto.
Desculpem-me como quem desculpa um assassino: fechem os olhos e sigam reto.

para Eráclito Borges


O desejo dele, de Jorge, era de tê-la como alguém tem a cabeça empalhada de um animal na parede manchada da sala. Lembrança de uma caçada. Se a cabeça ousasse mover os olhos para expulsar um cisco, ou se a cabeça oscilasse um pouco massageando o torcicolo, Jorge gritaria raivoso do quarto em que dormia pontualmente às onze horas: ‘chega. Me incomodas’. Jorge não sabia que no verso da parede, nas costas da parede, no lado da parede que ele nunca via, continuavam, a partir da cabeça do animal, o tronco, as patas, o rabo. Era apenas a cabeça empalhada o que Jorge conhecia. Na memória dele, projetada feito uma cópia velha de filme (rabiscos como minhocas passeando no granulado preto e branco), as cenas do tiro liberando a bala que atingira o corpo esguio do animal selvagem. Do todo do animal restava a cabeça sustentada por dois pregos enferrujados. Os gritos e o brilho nos olhos viviam em um passado do qual ninguém, nem Jorge, nem o animal, se lembravam. O amor que ele, Jorge, nutria por ela, era o amor que alguém nutre pela cabeça empalhada de um animal na parede manchada da sala. Lembrança de uma caçada.
Jorge encarou a mulher que caminhava na sua direção (‘chega. Me incomodas’), beijou a sua testa lisa (‘chega. Me incomodas’), beliscou carinhosamente a sua bochecha (‘chega. Me incomodas’), e disse (‘chega. Me incomodas’) ‘eu te amo’.
Beijo

5 comentários:

Léo Kufner disse...

auuahhuahuauhhuaua

lindo o poema
engraçado o texto

me identifico (sempre neh, uhauauhauhauhaua)

(agora não tenho pq fazer humpf)


bjooooo

Jorge Gumz disse...

nossa!

que bafo esse Jorge... rsrsrsrs
lindo os textos...

;)

Anônimo disse...

Pobre Jorge,com a cabeça atormentada por um coracao com a parede manchada!

Bjins Greg,
Nane.

Aninha disse...

‘chega. Me incomodas’ Não tu. Mas o que me veio a cabeça quando li. Mas não pára, preciso deste incômodo.
Um beijo! :)

Sandra Knoll disse...

Teu texto é lindo. O outro também. E eu sinto tão forte a tua indentidade nele.
Beijos, te gosto muito...saudades.